quarta-feira, 17 de março de 2010

OS ROYALTIES DO PETRÓLEO E DA PITOMBA

 

OS ROYALTIES DO PETRÓLEO E DA PITOMBA

Uraniano Mota



Recife (PE) - A última votação do petróleo no Congresso Nacional gerou toda sorte de ignorância, casada e rimada com arrogância. A julgar pelo Jornal Nacional, teve início um combate do gênero todos contra o Rio de Janeiro. Segundo as imparciais reportagens, os estados da federação estariam tentando um assalto aos recursos naturais mais fluminenses que o Zé Carioca. No ar, além das imagens das lágrimas de Sérgio Cabral Filho, os brasileiros de todos os brasis viram fumaças de uma nova guerra de secessão. E com algumas ameaças: adeus, olimpíadas, adeus, Copa, adeus, colírio de nosso maior cartão postal. Mas se no parágrafo seguinte couber um breve recuo no tempo, veremos que o primeiro assalto foi cometido antes da votação, contra o espírito público.

Tudo começou com a proposta do governador Eduardo Campos, que sugeriu uma repartição mais justa – vale dizer, para todos os estados brasileiros - dos royalties do petróleo da camada pré-sal. Atenção, vocês leram bem: a idéia, ou a filosofia, como dizem os burocratas, era para os recursos do petróleo no pré-sal. Na proposta nada havia que mudasse as regras em vigor para os recursos mais cariocas que o Zé de Walt Disney. Em vigor? Sim, mas que balançaram depois das declarações do governador Sérgio Cabral, que se referiu a "roubo" dos royalties, quando ainda se discutia a partilha federativa das receitas do pré-sal. Então os 369 deputados "ladrões" responderam contra os 72 que julgavam ter eterno o velho vigor.

A coisa, já antes, tamanha era a arrogância, já havia descido a perigosa ladeira do deboche. Em artigo na Folha de São Paulo, em dezembro de 2009, Ruy Castro tentara o caminho da sátira, da graça, um gênero em que lhe faltam graça e talento. Assim falou Ruy, o biógrafo de Nelson Rodrigues:

"O Estado de Pernambuco é responsável por 85% da mangaba e da pitomba produzidas no Brasil. Um abençoado acidente geológico fez com que seu território fosse ideal para a exploração dessas frutas, que são boas de comer ou servem de base para sucos e sorvetes e respondem por boa parte da economia pernambucana....

Pois vamos supor que, de repente, o Rio, que só produz caju e banana, resolva unir-se a outros Estados que também não produzem mangaba e pitomba e, juntos, comecem uma campanha para que os royalties das ditas frutas destinados a Pernambuco sejam distribuídos por igual entre os Estados. A alegação é a de que Pernambuco não é dono do Brasil, que a mangaba e a pitomba pertencem a todos e que cabe à União socializar a dinheirama gerada por elas".


Ora, brincadeira tem hora. O insigne Ruy Castro, ao escrever com a tinta da galhofa, naquele dezembro não soube nem viu que essa pitomba "base para sucos e sorvetes" tem um caroço desproporcional, que atrapalha qualquer voo gastronômico. A sua polpa – da pitomba – é fina, grudenta e avara, agarrada ao caroço de um modo tal que prejudica os mais saborosos sucos e sorvetes. Não teria sido melhor que o colunista, naquele dezembro, tivesse visto alguma vez uma pitomba?

Mais: de onde Ruy teria retirado que, além de petróleo, o Rio só produziria caju e banana? O abacaxi, o coco e a laranja também mereciam e merecem um lugar no tabuleiro. E de que lugar ele concluíra, sei, era só um véu de alegoria, uma espirituosa aproximação, mas em que alegres trópicos as frutas pagariam royalties? Talvez nas terras em que pitombas pulassem na esteira rolante de indústrias revolucionárias. Sem caroço, limpas e puras, só polpa.

Voltando ao passado mais próximo, o fato é que Paulo Bernardo, o ministro do Planejamento, afirmou há poucos dias que "o pagamento dos royalties sobre as atuais reservas continua como está, mas haverá novas regras para as jazidas do pré-sal, em que todos os estados e municípios terão o mesmo direito. Não tem cabimento deixar que o petróleo explorado a 250 quilômetros da costa renda royalties para apenas um estado, um município".

A essa declaração pública, o governador Sérgio Cabral faz de conta que não é com ele. Na hora em que esta coluna se publica, ele chama para um ato público pela sobrevivência dos royalties em vigor. E dos que virão, pois grande é seu particular espírito público. Mas para maior clareza ele deveria chamar também, em alto e bom português: "o petróleo é nosso, brasileiros, mas o nosso aí é do Rio de Janeiro".

 

MALES QUE VÊM PARA BEM

Mair Pena Neto

A questão dos royalties cria uma oportunidade ímpar para a mobilização da população carioca e de todo o estado do Rio de Janeiro. Oportunidade que deveria ser aproveitada não apenas para recuperar o que havia antes, mas para transformar a distribuição dos recursos provenientes da exploração e produção do petróleo em algo que realmente melhore a vida da população brasileira e dos Estados e municípios produtores.

O petróleo é um bem da União e os ganhos de sua exploração devem ser repartidos entre todos os entes federativos. Mas é lógico que estados e municípios produtores devem receber fatia maior por sofrerem os impactos desta exploração. Todos devem lembrar do megavazamento de 800 toneladas de óleo na Baía de Guanabara, em 2000, por conta do rompimento de um duto próximo à Refinaria Duque de Caxias (Reduc), na Baixada Fluminense.

Muitos também devem saber do inchaço de cidades como Macaé, base de operações das petroleiras que atuam na Bacia de Campos. A pacata cidade praieira teve uma explosão populacional e de crescimento, que junto trouxe violência e falta de infra-estrutura básica. Os royalties servem como um recurso extraordinário para enfrentar problemas como esses, decorrentes da atividade petrolífera.

O Rio precisa ser recompensado, assim como o Espírito Santo, São Paulo, Bahia e todos os estados que abrigam campos e instalações petrolíferas. Mas a hora não é para bairrismos e sim para defender justiça e aperfeiçoar os mecanismos de distribuição dessa renda. Municípios do Rio de Janeiro se empanturraram de dinheiro nos últimos anos, e a maioria pouco se preparou para um futuro sem petróleo, deixando de lado medidas estruturantes. Por outro lado, o desperdício imperou, com obras de embelezamento e outros destinos menos nobres.

Mesmo o município e o Estado do Rio de Janeiro pouco fizeram. Ou alguém viu alguma mudança substancial na qualidade da educação, saúde e saneamento nesses locais? O debate dos royalties deveria levar as populações destas cidades a cobrarem investimentos no que realmente importa, e um bom caminho seria carimbar parte destes recursos para saúde e educação, por exemplo. Dessa forma, estes municípios passariam a ter escolas e hospitais de excelente qualidade, equipamentos de ponta e profissionais bem remunerados.

Nem sempre carimbar recursos garante a sua correta aplicação, mas a população mobilizada poderia assegurar isso. Ir para a rua convocado pelos governos é uma coisa, assumir o protagonismo dessas manifestações é outra bem diferente. A oportunidade está colocada.

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